Preferência do consumidor ainda é pelo corretor!

Publicado por em 30 de maio de 2023

O Valor, em um especial nesta terça-feira (30), divulgou uma série de matérias sobre seguros. De acordo com o portal, quem contrata um seguro quer entender no que está gastando dinheiro e, para entender, precisa interagir com um humano, como mostram até mesmo as iniciativas de vendas de seguros que nasceram para ser digitais. Nem na comercialização do seguro mais popular e com maior penetração no Brasil, que é o de automóveis, a jornada digital é completa.

Prêmio de seguro. Como explicar a um cidadão que tem um seguro que o premiado não é ele, mas a seguradora? Sinistro. Como explicar a um jovem que, em vez de ser algo muito legal, isso significa que ele bateu o carro, ou foi parar no hospital, ou teve o celular roubado, ou muitos Pix foram feitos sem sua autorização? Estes dois termos são exemplos simples que dão a dimensão de como o setor de seguros é complexo e difícil de ser entendido por um consumidor comum. E é nesta complexidade que reside uma das principais dificuldades em tornar a venda de seguros um processo 100% digital. E é também o motivo que pode significar uma vida longa para os corretores de seguros, porque não é tarefa fácil substituí-los por robôs.

Um exemplo interessante vem do Autocompara, um agregador digital do banco Santander que realiza simulações entre diferentes seguros de automóveis, coberturas e seguradoras. Apenas 25% das vendas são feitas completamente online, enquanto os outros 75% dos clientes que contratam um seguro de automóvel pela plataforma ainda desejam ter uma conversa antes de finalizar a negociação. Murilo Riedel, diretor da vertical de seguros do Santander, explica que o seguro de automóvel envolve uma variedade de coberturas, como casco, responsabilidade civil, acessórios, vidros e assistência, além da escolha da franquia. O processo de cotação não é tão simples, é necessário compreender o que está sendo adquirido.

Embora essa complexidade represente um desafio para a digitalização, também abre oportunidades para os corretores. Atualmente, o Brasil possui cerca de 130 mil corretores cadastrados na Superintendência de Seguros Privados (Susep), sendo mais da metade deles pessoas físicas. Diego Rocha, idealizador e coordenador do curso de aceleração digital para corretores de seguros da Escola de Negócios e Seguros e head de estratégia da seguradora digital Simple2u, destaca que há dois anos, quando a Susep lançou seu próprio ambiente de testes para estimular a inovação no setor, algumas startups tentaram oferecer seguros totalmente digitais, eliminando o corretor. No entanto, elas logo perceberam que o custo de aquisição de clientes era muito alto, pois esse produto requer educação, até mesmo no conceito básico: o que é um seguro?

E não são apenas os consumidores finais que têm essa necessidade de educação. Varejistas, postos de combustíveis, instituições financeiras, comércio eletrônico e franquias, que poderiam substituir o corretor na distribuição dos produtos, também não compreendem totalmente o que é um seguro, e as seguradoras sozinhas não têm a capilaridade necessária para levar informações de ponta a ponta do país. Portanto, é fundamental contar com corretores que conheçam os mercados locais. Nesse sentido, é muito mais eficiente trazer a transformação digital para o ambiente do corretor de seguros. Diego Rocha encerrou recentemente a segunda turma do curso de aceleração digital para corretores.

No entanto, a digitalização exige esforço por parte dos corretores. Rocha destaca a importância de compreender o open insurance, que permitirá a troca de informações dos consumidores, os diferentes meios de pagamento, a moeda digital e temas como design thinking, personas, tecnologias de integração, páginas de destino, comércio eletrônico, SEO e UX (experiência do usuário). Os corretores já possuem o conhecimento técnico do setor de seguros, mas é o conhecimento tecnológico que lhes permitirá apresentar propostas, convencer as seguradoras de um lado e os varejistas do outro.

De acordo com o Valor, o modelo de negócios B2B2C (empresa para empresa para o consumidor) tem sido uma aposta das startups. Para que competir com uma rede de distribuição de empresas que já está estabelecida e chega a milhões de pessoas físicas? O Nubank, só para dar um exemplo, possui uma base de 70 milhões de clientes e desde que começou a ofertar seguros, em 2020, vendeu um milhão de apólices nos segmentos auto, vida e celular, sempre em parceria com seguradoras ou corretoras.

O modelo de conectar seguradoras e varejistas, mas com foco em como se comunicar com o cliente final, foi o escolhido pela startup 180° Seguros, uma das jovens insurtechs voltadas exclusivamente para a atividade de corretagem. O CEO e cofundador da empresa, Mauro Levi D’Ancona, explica que o melhor produto e o modelo mais escalável, pelo qual a conta fecha, é ainda por meio do parceiro.

A 180° Seguros adota uma abordagem personalizada para seus produtos e conta com uma equipe de pesquisa para identificar as necessidades dos consumidores. Foi dessa forma que a corretora ajudou a desenvolver o seguro Pix para Recarga Pay, que cobre as perdas de todos os aplicativos bancários presentes no celular do cliente, não se limitando a um único banco. Além disso, eles criaram o seguro por hora para proteger os bens deixados dentro dos carros dos clientes da Zul+, empresa responsável pela operação da Zona Azul em Curitiba (PR). Também implementaram um sistema de pontos para o seguro residencial dos clientes da Loft, uma corretora imobiliária digital. Esse sistema permite que os segurados escolham quais serviços desejam utilizar e com que frequência, sem estarem restritos a padrões pré-estabelecidos como em outros seguros.

No ano passado, a empresa recebeu um investimento de US$ 31 milhões de investidores e já vendeu 150 mil apólices para clientes de 12 parceiros. Outros quatro parceiros estão em processo de implementação para começarem a vender os produtos. “Seguro é distribuição. E a tecnologia permite oferecer o seguro certo para a pessoa certa no momento certo”, afirma o executivo D’Ancona, que possui experiência no mercado de bancos e fintechs e foi um dos fundadores da 180º após trabalhar no Nubank.

O BTG Pactual, além de ser um banco de varejo, atua como corretor de seguros e também adotou a estratégia de utilizar a tecnologia para oferecer o seguro adequado para cada cliente no momento oportuno. A entrada nesse ramo se deu pelo fato de o banco, assim como praticamente todos os concorrentes, desejar que o cliente possa adquirir todos os tipos de produtos financeiros em um único local, incluindo seguros. Foi a tecnologia que permitiu ao banco identificar que seus clientes estavam frequentemente comprando passagens internacionais por meio de cruzamento de dados. Assim, foi natural para o banco começar a oferecer seguros de viagem, que são exigidos para entrar em muitos países.

Rocha, da Escola de Negócios e Seguros: curso digital para corretores — Foto: Divulgação

O BTG também pesquisou o seu cliente e passou a oferecer uma cobertura adicional para o caso de roubo de celular durante a viagem. Este é um tipo de apólice que o cliente faz 100% de forma digital, mas isso não vale para outros tipos, como o seguro de vida, em que o BTG ainda exige que o consumidor passe por um consultor. Isso mesmo, exige. Gabriel Escabin, diretor do banco, explica que este é um seguro mais complexo, muitas vezes envolve planejamento sucessório e se o cliente não entender o que contratou, assim que o seguro encarecer, ele vai cancelar o produto.

Se os novatos no ramo usam e abusam de tecnologias, as empresas centenárias também estão tendo que se adaptar. Mas, como os próprios clientes ainda exigem um modelo híbrido entre o digital e o físico, elas andam mais devagar neste mundo digital do que outros setores, como o de bancos e fintechs. Os corretores costumam chamar esse modelo de figital.

A Marsh, que tem 150 anos, começou a fazer sua transição há quatro anos, quando criou o portal voltado para o cliente corporativo, que é a especialidade da corretora. Na época, apenas 10% das vendas de seus seguros eram feitas com troca de documentos de forma digital. E mesmo assim, era uma troca por e-mail. Hoje, todos os documentos podem ser entregues pela nuvem, mas o percentual de uploads chegou a apenas 50%, mostrando que muitos clientes ainda seguem conservadores e amantes do papel. No seu portfólio, a empresa tem seguros que vão de cibersegurança a seguro de grandes hidrelétricas e parques fabris. O diretor de afinidades da corretora, Roberto Clark, conta que as pessoas ainda preferem o ambiente físico. “Ainda hoje 92% das vendas são feitas com a interferência de um consultor, por opção do cliente”, diz Clark.

Essa preferência pelo mundo físico também atrasou a entrada no mundo digital de corretoras como a Aon. “O nosso modelo não via uma vantagem muito grande em entrar de cabeça [na digitalização]”, diz Mauricio Masferrer, vice-presidente de riscos e seguros corporativos da Aon, outra multinacional do setor e que nasceu na década de 1980. “Todas essas novas empresas têm muito pouco tempo. Em tese estamos começando juntos.” Mas Masferrer diz que o mercado está evoluindo para fazer uma distinção clara dos diferentes tipos de cliente. Quem é bom motorista de fato, quem tem maior ou menos risco de morte, tudo isso definirá o futuro dos preços das apólices.

Segundo o Valor, esse é o tipo de análise que a Lockton já faz para os seus clientes, conseguindo reduzir o custo de apólices de saúde empresariais entre 10% e 15%. Com a análise de dados é possível identificar desvios dos padrões e fazer uma ação preventiva. A corretora conseguiu observar, analisando os dados de um de seus clientes, que a frequência de procedimentos para a coluna estava muito acima da média. Em pouco tempo, cinco usuários fizeram cirurgia de coluna, totalizando mais de R$ 1,2 milhão em sinistros. Os robozinhos foram colocados para funcionar e descobriram, por meio de modelos preditivos, que quase 200 beneficiários do plano em questão tinham risco de ter que fazer em breve uma cirurgia de coluna. Com os dados em mãos, a cliente da Lockton contratou ortopedistas para suas fábricas em São Paulo e Rio de Janeiro, começou a realizar terapias alternativas e conseguiu fazer uso de indicação e realização de cirurgias menos invasivas.

“Os clientes querem muita tecnologia, querem ter autosserviço e acesso a dashboards [ferramenta que auxilia na visualização de dados e métricas] analíticos”, diz Carlos Eduardo Sarkovas, diretor da área comercial da Lockton. “Antes, levávamos 15 dias para apresentar uma cotação. Agora é amanhã.” A corretora, que é independente, fechou recentemente a compra da THB Brasil, que fazia parte do grupo Amwin, a maior corretora de seguros de varejo nos Estados Unidos. A nova empresa nasce no Brasil com uma receita de R$ 3 bilhões. A união das duas companhias vai trazer mais tecnologia ao portfólio da empresa.

Enquanto isso, a It’sSeg, uma das primeiras startups do setor com oito anos de existência e que alcançou mais de R$ 5 bilhões em prêmios de seguros no ano passado, aposta em uma análise de dados precisa para agregar valor aos clientes e demonstrar que a digitalização é uma ferramenta, não uma ameaça. Embora atue principalmente com clientes corporativos, a empresa incentiva os usuários de seguros a utilizar seu aplicativo por meio de estratégias de gamificação de conteúdo. Isso permite que os consumidores forneçam uma variedade de informações que, posteriormente, podem ser analisadas e auxiliar no cálculo de riscos dos produtos. “Uma das dificuldades que as seguradoras enfrentam é analisar um grande volume de dados. Se não houver um humano para interpretar e tirar conclusões, premissas e previsões desses dados, a tecnologia não terá utilidade”, afirma Thomaz Menezes, presidente da It’sSeg, que acredita que a profissão de corretor de seguros continuará crescendo.

A quantidade de possíveis distribuidores é um dos motivos pelos quais a necessidade de corretores será cada vez maior. Diego Rocha, da seguradora Simple2u, que oferece seguros por hora, relata sua participação em um dos maiores eventos sobre o mundo digital realizado no Rio de Janeiro no início de maio, onde teve contato com 40 empresas de aplicativos diferentes. “Qual seguradora tem capacidade para lidar com todas essas 40 empresas?”, questiona Rocha. “É o corretor que precisa atuar como intermediário.”

Notícias | 30 de maio de 2023 | Fonte: CQCS l Alícia Ribeiro


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